PRÓLOGO
PRIMEIRO AMOR
i
OS
CAPOTES BRANCOS
Era
no inverno de 1729- A noite viera cedo, noite
aspérrima
de Novembro, torva e fria. Tinham dado nove
horas.
Hora tardia para a gente pacata daqueles tempos.
Dali
a pouco, pelas ruas estreitas de Lisboa, sem luz e sem
polícia,
apenas ousariam transitar os galãs e os ébrios, os
espadachins
e os gatunos. Algumas raras vezes, por excepção
daquelas
rudes noites, passavam nas ruas os quadrilheiros da
ronda,
acaudilhados pelo corregedor, rasgando as sombras
com
os rubros lampejos das suas lanternas de furta-fogo.
Próximo
do vasto palácio dos Marqueses de Marialva,
ao
Loreto, catorze ou quinze embuçados, de capas pretas
PRIMEIRA PARTE
OMNIPOTENTE
I
O TERRAMOTO
Um
dia Formosíssimo, tépido, luminoso, dia excepcional
de
Novembro! O céu muito azul, de um profundo azul que
parecia
não ter fim, o sol rútilo e quente como nos dias de
Julho,
o Tejo a reverberar fulgores, sereno como um lago.
Era
o primeiro dia do mês. Singular Novembro aquele
de
1755! Dir-se-ia que o Verão não tinha fim! O Outubro
fora
um mês de estranhos calores.
Dia
santo, o dia solene da festa de Todos-os-Santos, e o
povo
de Lisboa, ainda madrugador, começara cedo a sua
romaria
às numerosas igrejas da cidade. Logo ao romper
de
alva se tinham iluminado os altares; os sinos repicavam
O HOMEM
Achamo-nos no último domingo de Setembro de 1757.
Sebastião de Carvalho é um
homem essencialmente metó-
dico e prático. Não desdenha
descer das mais altas questões
da política internacional ou da administração interna aos
mais comezinhos problemas da fazenda e aos mais insigni-
ficantes assuntos da
segurança pública e dos serviços admi-
nistrativos.
[ Tem cooperadores, carece de auxiliares, precisa da cola-
boração daqueles a quem hoje
chamaríamos os técnicos;
mas o seu prodigioso cérebro
a todos subordina e dirige;
mas o seu pulso de gigante a
tudo imprime acção e vigor,
SEGUNDA
PARTE
A COMPANHIA DE JESUS
XVI
A EXPULSÃO DOS JESUÍTAS
Na data de 19 de Janeiro foram expedidas as cartas
régias aos chanceleres das Relações de Lisboa e Porto,
expondo os erros e delitos dos padres da Companhia de
Jesus e regulando o sequestro dos seus bens e a reclusão
e incomunicabilidade em que haviam de ficar até ulterior
determinação.
Com a mesma data foi enviada também outra carta régia
ao arcebispo de Braga, resumindo as acusações contra a
Companhia. Acompanhava uma cópia do longo libelo formulado
contra os jesuítas e exortava
o prelado a opor as
5
O MARQUÊS DE POMBAL
puras doutrinas da Igreja às cavilosas maquinações e venenosos
princípios daquela
congregação religiosa.
Em linguagem figurada, a carta régia ao primaz das
Espanhas indicava assim a intenção de El-rei, descrevendo-
-lha; para que, sendo informado do venenoso pasto, que
a malignidade tem pretendido dar às vossas
ovelhas, o ,
possais fazer arrancar pelo vosso pastoral
ofício, de sorte
que elas, em vez de tão mortífera peçonha,
sejam só apascentadas
útil e
saudavelmente nos campos que cultivaram
os mais zelosos e exemplares obreiros da vinha
do Senhor.
Para Roma tinham sido remetidas:
Em 15 de Abril uma súplica ao Pontífice por parte
do procurador da Coroa, para que à Mesa da Consciência
e Ordens fossem concedidos os poderes necessários, permanentes,
para julgar e relaxar às
justiças temporais os clérigos
religiosos e regulares, implicados em crimes de alta traição
contra o Soberano ou contra a segurança do Estado. O procurador
aduzia precedentes e lembrava
os breves de Gregório
XIII, de Leão X e de Pio IV,
pontífices que, no
século XVI, tinham reconhecido aos reis de Portugal o
direito de relaxar às justiças seculares os eclesiásticos que
delinquíssem contra a pessoa do rei ou contra a tranquilidade
e os direitos do Estado.
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